segunda-feira, 20 de outubro de 2014

O JUIZ



Pois sim, O Juiz é um melodrama pensado para comover o espectador que, em prantos, sairá da sala com a impressão de ter assistido a um profundo drama familiar. Mais ou menos como era o caso do recente e aborrecido Álbum de Família, que lá confundia “ser triste” com “ser complexo”. O que torna O Juiz diferente daquele projeto protagonizado por Meryl Streep é que, aqui sim, apesar dos maniqueísmos desnudos de que o roteiro usa para atingir seu púbico, o filme de fato é eficiente em ser tocante e, ao menos, sóbrio, ainda que tente com afinco se sabotar.


Diretor de carreira insípida até o momento, é provável que este David Dobkin encontre em O Juiz o seu trabalho mais regular. E me pergunto se é apenas coincidência ou realmente houve alguma inspiração na abertura do documentário nacional Santiago de João Moreira Salles quando o cineasta decide abrir seu filme com objetos mostrados individualmente – em uma paleta quase monocromática - e que mais tarde descobriremos serem pequenos resumos dos personagens que os possuem. Mas ao mesmo tempo em que tem estas poéticas e boas ideias, que geram uma dramática e boa cena numa banheira mais tarde, Dobkin também é o cara que perde não apenas uma, mas ao menos três chances de terminar seu filme mais cedo e de maneira muito mais poderosa do que o plano que acaba escolhendo para isso. O que faz do fechamento do projeto, aliás, a prova de que o diretor parece ainda não ter compreendido que economia também é poder.


Mas ao invés de sugerir, O Juiz muitas vezes prefere esfregar na fuça do espectador toda a sua “carga dramática”. Acontece que conta a história de um advogado bem sucedido de Chicago, Hank Palmer (Robert Downey Jr.), que com a morte da mãe é obrigado a comparecer a cidadezinha em que cresceu e onde o pai, Joseph Palmer (Robert Duvall), com quem não se dá bem, trabalha como juiz e é visto com respeito por todos. Porém, quando esse último é acusado de homicídio, o filho se vê ficando no lugarejo para tentar ajudá-lo, ao passo em que tentam resolver todos os anos de mágoas e brigas.

Neste processo, surge uma sequência durante uma viagem de carro em que Hank, seus dois irmãos e Joseph discutem um antigo acidente. Sendo importante que entendamos este acontecido, é óbvio que ele precisava ser esclarecido, mas soa apenas tolo quando o filme faz isso colocando os personagens que já conhecem a história contado-a para... Quem!? Eles não conhecem a história!? Então, a não ser que trate-se de um exercício metalinguístico onde a quebra da quarta parede se dá com uma sutileza incrível, é simplesmente um recurso absurdamente tolo e implausível. Mas sutileza definitivamente não parece ser a onda de Dobkin; para a briga final entre pai e filho, é concebida literalmente uma tempestade, que de outra maneira não influencia em mais nada a trama, está lá para contextualizar a fúria de ambos, em uma espécie de exercício de ultra romantismo praticado apenas nesse segmento do filme.


A trilha é outra que não ajuda em nada. Recheadas de acordes bobinhos e ingênuos, as composições de Thomas Newman buscam claramente conduzir o espectador a certos sentimentos, como se fossemos todos incapazes de entender o básico aqui deste lado da tela. Situação triste: melodia melancólica. Situação divertida: melodia animada. Situação séria: melodia tensa. É tão desnecessária sua intromissão no nosso entendimento dos fatos, que ouso dizer que o filme ficaria algumas vezes melhor se preferisse o silêncio nos momentos em que entraria Newman. Aliás, em sua concepção todo o projeto apresenta tropeços: depois da tal tempestade e da trilha, ainda surge uma plaquinha com o nome do juiz que julgará Joseph, que diferente da plaquinha do mesmo, é de cor preta, para ficar claro até para os mais desatentos: “é um personagem de oposição!”. A montagem fecha o pacote com algumas ingenuidades também; é um corte cômico que demora tempo demais para acontecer, perdendo o timing; é um fade to white horroroso para introduzir uma lembrança – a pior inserção de flashback; e o desfecho já citado que se perde em inúmeros desdobramentos desnecessários que poderiam ter ficado na imaginação sem problemas. Mas admito que a tela quebrada do celular de Hank é um detalhe intrigante, não por representar alguma verdadeira natureza do personagem, mas por mostrar que na prática, o advogado realmente não liga para todas as aparências que ostenta, e em algum lugar no fundo, mesmo que seja o fundo de seu bolso, ele ainda é o garoto simples e rebelde da cidadezinha pequena de onde veio.


O que me leva até Robert Downey Jr., que mesmo não estando fantástico, merece todos os elogios por conseguir se manter em um raro personagem sóbrio e pouco afetado. Em outras palavras, muito mais humano. De novo, a cena da banheira, que divide com Duvall, é ótima ao retratar um momento tão trágico que Dobkin acertadamente transforma em cômico por também representar uma reaproximação entre as duas figuras. O ator mais veterano, aliás, convence de sua fragilidade tanto quanto de sua austeridade, impregnando de empatia a relação entre os dois, mesmo que conflituosa. E é apenas graças a eles que o filme chega ao fim com algum grau de comoção, já que a própria trama do julgamento em si é bastante desinteressante, apesar dos joguetes que, convenhamos já vimos sendo melhor executados em diversas outras obras. Uma pena, já que é somente nessas cenas que temos Billy Bob Thornton em cena. Que por falar nisso, não é o único coadjuvante mal utilizado, fazendo companhia a Vera Farmiga também neste quesito; ela que protagoniza uma subtrama envolvendo uma possível situação incestuosa com Hank, que no fim, não dá em nada.


NOTA: 6/10


Um comentário:

  1. Quero conferi-lo pois estou muito curioso com a atuação dos dois Roberts. Espero me agradar.

    ResponderExcluir