sexta-feira, 27 de outubro de 2017

A MORTE LHE DÁ PARABÉNS



A ideia popularizada em Feitiço do Tempo (1993) já foi tão explorada desde então que formou praticamente um subgênero, montando um espectro que vai de extremos como os bons Contra o Tempo (2011), Questão de Tempo (2013) e No Limite do Amanhã (2014), até o detestável Nu (2017). Trata-se, claro, da premissa de uma pessoa que revive o mesmo período de tempo de novo, de novo e de novo, tentando viver aquela situação de formas diferentes a cada vez. Em algum lugar no meio disso está A Morte lhe dá Parabéns, que embora não seja um exemplar especialmente criativo desse nicho, é ainda assim um longa que consegue converter a estrutura cíclica da narrativa em diversão. Isso porque, apesar de dirigido pelo mesmo Christopher Landon do decepcionante Como Sobreviver a um Ataque Zumbi (2015) e do horroroso Atividade Paranormal: Marcados pelo Mal (2014), o projeto se depende menos da condução trôpega deste, e muito mais do carisma da atriz Jessica Rothe, que vive a protagonista com energia e delicadeza o suficientes para que torçamos pela moça.


A ideia que Feitiço do Tempo popularizou em 1993 já prendeu muitos personagens num mesmo dia de suas vidas, que normalmente começam notando alguma familiaridade estranha (como um filme que é citado no mesmo momento de uma frase em dois parágrafos seguidos), quando normalmente se descobrem fadados a repetir aquelas 24 horas até que aprendam alguma lição. E não é diferente o que acontece com Tree (Rothe), que passa a viver diversas vezes o dia de seu aniversário, em que, todas as noites, é assassinada por um estranho mascarado. Em algum lugar no meio disso está Carter (Israel Broussard), que embora não seja uma pessoa próxima de Tree, torna-se seu confidente sobre a situação e sugere que a garota use suas infinitas vidas pra tentar descobrir quem é o seu assassino. Isso porque, não importa o que faça a estudante, o seu perseguidor parece sempre encontrá-la.


Feitiço do Tempo, de 1993, popularizou essa estrutura de repetição, (espera, eu já não falei desse filme?), usando-a para que criássemos empatia com uma gama de personagens além daquele vivido por Bill Murray, apenas porque já conhecíamos suas reações, o que os tornava familiares. Em algum lugar no meio dessa ideia, o humor de A Morte lhe dá Parabéns acerta ao, assim como naquele longa-metragem, apostar que a personalidade rabugenta de sua protagonista irá despertar não a repulsa do espectador, mas sim sua torcida para que a personagem mude de atitude. Isso porque, não importa o quão detestável seja uma figura central, se todos os outros personagens forem irracionais (e aqui eles o são por desconhecerem a repetição temporal experimentada por Tree), tenderemos a ficar do lado daquele que demonstra consciência.


Entretanto, a curiosa estrutura repetitiva, popularizada em 1993 com Feitiço do Tempo, poderia facilmente se tornar irritante, como um texto que insiste em citar o mesmo filme inúmeras vezes para provar um ponto porque se acha muito esperto. Porém, sua fama lhe permitiu alcançar os filmes de horror e seus clichês, e embora normalmente seja condenável o uso batido dos estouros nas caixas de som para assustar o espectador, é interessante notar que aqui, em algum lugar no meio disso, Landon faz o recurso funcionar de maneira orgânica. Com sua direção apenas correta, o realizador consegue extrair bons momentos de tensão e riso, isso porque é especialmente interessante como ele usa recursos para energizar a narrativa, como os dutch angles (planos inclinados) junto com travellings sempre que quer ressaltar o desespero de Tree, o que tornar as perseguições no hospital pontos altos de sua condução.


Porém, como comprova Feitiço do Tempo (1993), que chega a ser citado por Carter (ainda bem, não tantas vezes quanto nesse texto), esse tipo de filme é tão bom quanto seus personagens. E em algum lugar no meio da galeria de figuras que habitam o universo de Tree, há uma ou outra interessantes (como ela mesma ou Carter), mas as outras são tão insípidas que qualquer uma delas poderia ser o assassino que não faria diferença para o desfecho - e de fato não faz. Isso porque quando somos levados a conhecer o plano completo, a heroína é a única pessoa na trama com quem realmente nos importamos, e as catarses que poderiam surgir se perdem.


Por fim (e esperemos que a “lição final” deste texto venha agora, pois), ao contrário de Feitiço do Tempo (1993), não há carisma no enredo, e nem mesmo as repetidas vezes que Tree vive seu dia o torna mais memorável. Em algum lugar no meio disso há algum humor que funciona, principalmente nas comparações entre as várias versões de um mesmo evento, mas apenas. Isso porque A Morte lhe dá Parabéns  é um filme que consegue divertir pontualmente, mas que não desperta a vontade de revê-lo de novo, de novo e de novo.


O que não pode ser dito de Feitiço do Tempo, 1993.



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