AVISO QUE: No texto a seguir não será discutido o uso da aguardada tecnologia dos 48 quadros por segundo, nem mesmo o uso do 3D no longa, uma vez que a cabine de imprensa na qual o assisti foi apresentada nos normais 24 quadros por segundos e no bom e velho 2D. Por isso, um texto falando sobre o uso de tais formatos em O Hobbit - Uma Jornada Inesperada será publicado imediatamente após o longa estrear, assim como um terceiro texto falando especificamente sobre a relação livro e filme. Segue a crítica!
ATUALIZADO: Leia nossa opinião sobre os 48 quadros por segundo (tecnologia HFR) clicando aqui!!
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Surgindo
sob a sombra da trilogia O
Senhor dos Anéis, esta nova adaptação de uma obra de J. R. R. Tolkien
dirigida por Peter Jackson pode ser encarada como uma realização inferior àquela
vista em A Sociedade do Anel se for comparado o peso dramático, a
urgência da trama e até mesmo o dinamismo do longa em si. Porém, cobrar tais
aspectos de um filme que se propõe desde seus primeiros minutos a contar uma
leve e divertida aventura, é simplesmente exigir um longa totalmente diferente,
e neste caso, sugiro que assista de novo ou pela primeira vez a já citada
trilogia do Anel, pois adaptando fielmente (literalmente às vezes) o texto
original de Tolkien, O Hobbit
- Uma Jornada Inesperada, embora possua os mesmos equívocos do livro no
excesso de personagens e Deus
Ex Machinas, é ainda um filme cativante, divertido, bem construído e que
esbanja no carisma das figuras que povoam seu universo. E neste caso até mesmo
sua longa duração, recheada de cenas que poderiam ser facilmente descartadas, acaba passando despercebida tamanho o cativo de seus protagonistas, uma vez que
diferentemente do que acontecia em O
Senhor dos Anéis, aqui não são eles que estão a favor da trama, e sim ela,
a trama, que está a favor dos personagens.
"Em uma toca no chão vivia um hobbit", mais exatamente, Bilbo
Bolseiro (Martin Freeman), um pacato e muito bem abastado hobbit que certo dia
é importunado por Gandalf (Ian McKellen), um velho mago procurando um bom
ladrão para se juntar a comitiva de anões liderados por Thorin Escudo de
Carvalho (Richard Armitage) em uma aventura para recuperar o antigo reino de
Erebor, agora tomado pelo poderoso dragão Smaug (voz ainda não ouvida de
Benedict Cumberbatch). Seguindo a risca os passos da jornada do herói, Bilbo a
princípio rejeita a oferta de Gandalf, porém, após ter sua casa praticamente
invadida por Balin, Dwalin, Bifur, Bofur, Bombur, Fili, Kili, Oin, Gloin, Nori,
Dori e Ori, os anões seguidores de Thorin, o pequeno hobbit se vê tentado a
partir e desbravar as aventuras oferecidas pelos perigosos caminhos da Terra
Média. Assim, partem os treze anões, o mago e o hobbit contra Trolls, wargs,
orcs, gigantes e todo tipo de contratempo que o universo criado por Tolkien
pode oferecer.
Como pode perceber acima, somente o grupo de protagonistas possui quinze
personagens, portanto, não se culpe se no meio do filme você não souber quem é
Dori e quem é Nori, ou se Oin e Gloin são os mais parecidos e qual dos dois
mais jovens são Fili e Kili, pois com exceção de Thorin cujo desenvolvimento é
essencial a trama, o anão que ganha mais espaço em tela é o sábio Balin (Ken
Stott), e quase sempre, para ressaltar os feitos de Thorin. Mas Jackson é um
realizador inteligente, e sabendo que seria muito difícil fazer a identificação
individual com cada anão, o diretor prefere tratar a comitiva como um
personagem só, nos apresentando ao grupo, por exemplo, em uma divertida cena de
jantar onde mesmo não sabendo quem é quem, é muito tátil para o espectador a
dinâmica dos companheiros. Trazendo-os alegres e desleixados o filme aposta no
humor para criar o carisma do "personagem" (todos os anões) para com o público, e
assim, em quase momento algum do resto do longa vemos a comitiva agir separada,
sempre lutando, discutindo e agindo em grupo. O que acaba acarretando em um
problema, pois, por exemplo, em dado momento quando um anão está pendurado por um triz na
beira de um penhasco, nenhuma preocupação nos vem ao peito, porque sabemos que
aquele é apenas um dos membros de um grande grupo, e sua morte não
representaria maior choque para o espectador do que se um dos personagens
perdesse um braço ou uma perna. Ficaríamos sentidos, sim, mas pela perda do
grupo e não pelo personagem.
Porém, ainda que sendo conduzidos pela direção já experiente de Jackson
como uma força de união, é inegável que ali dentro estejam treze figuras com
suas próprias particularidades. E não tendo tempo em tela para desenvolvê-las
todas, o longa aposta na caracterização dos anões para diferenciá-los. Assim,
mesmo sem saber quem é Bombur, você será capaz de identificar com facilidade o
anão gordo, de barba ruiva e que possuí uma enorme trança atravessando seu
corpo como se fosse a alça de uma bolsa, do mesmo modo que saberá diferenciar o
anão com um chapéu de orelhas pontudas mesmo sem saber que aquele é Bofur, ou o
anão que não fala a língua de ninguém e que tem cravado na testa uma machadinha
não ligando o nome de Bifur à ele.
Do mesmo problema não sofre Martin Freeman, surgindo excepcional como
Bilbo e até mesmo convencendo ser a versão mais nova de Ian Holm. Atarracado e
sempre trazendo um tom mandão exasperado na voz, Freeman dá ao hobbit uma
postura sempre ereta e educada, digna de uma criatura que cresceu sozinha e
cheia de cerimônias em uma bela e polida casa, basta notar o jeito com que
Bilbo cavalga um pônei no começo do filme para entender o deslocamento do
personagem dentro daquela comitiva. E se na trilogia do Anel Ian McKellen
raramente tinha a oportunidade de mostrar o lado rebelde e descontraído de
Gandalf, aqui o ator ganha tempo em cena mais do que suficiente para conquistar
o espectador com o sábio e divertido mago cinzento, que divide uma pequena e
particularmente gostosa interação com outro veterano da série, Christopher Lee
de volta ao papel de Saruman. E falando no retorno de certos personagens, Cate
Blanchett, Hugo Weaving e Elijah Wood dão as caras novamente como Galadriel,
Elrond e Frodo respectivamente, ainda que a ponta que mais se destaque seja de
longe a de Andy Serkis como o icônico Gollum, que junto com Bilbo protagoniza
aquela que provavelmente deve ser a melhor e mais tensa cena do longa.
Aperfeiçoado pela evolução dos efeitos digitais, Gollum surge impecável
em sua concepção técnica e divertido na performance, o que infelizmente não
pode ser dito de todas as criações digitais do longa, já que um dos vilões, o
orc Azog (Manu Bennett) aparece sempre deslocado do resto da estética geral do
filme. E é curioso que até mesmo Jackson parece notar tal imperfeição, já que
ao contrário da confiança que demonstra com Gollum ao não lhe negar closes e planos
de proximidade assustadora que revelam a perfeição da criação gráfica que é a
pequena e magrela criatura, o diretor prefira manter Azog quase sempre afastado
de sua câmera e sob uma palheta de cores mais escuras, evitando a interação das
texturas do boneco digital com a luz o máximo que a trama lhe permite. Porém, o
orc é apenas uma exceção, pois avaliados como um todo, os efeitos digitais da
Weta voltam a impressionar no seu grau de preciosismo, principalmente no que se
trata dos inúmeros planos aéreos totalmente criados por computação gráfica que
Peter Jackson sempre gosta de usar e abusar em seus filmes. Neste quesito, as
cenas da invasão de Smaug e da divertida perseguição nas cavernas dos orcs
durante o clímax, representam os melhores momentos do longa, sendo esta última
também hilária ao apostar na criatividade com que, durante o caminho, os anões
e Gandalf vão se virando para se livrar dos orcs perseguidores.
O que me leva a um dos problemas mais recorrentes do livro e que por se
tratar de uma fiel adaptação, o filme também não conseguiu escapar ileso. O
grande Deus Ex Machina representado por Gandalf em O Hobbit. Surgindo sempre que
necessário e no último instante para salvar a todos com um lampejo de seu
cajado, o velho mago é constantemente chamado para fora da trama só para que
possa surgir como "elemento surpresa" mais tarde e salvar a pele dos
amados protagonistas em algum aperto. Não que, em comparação com o livro (e
como já disse haverá um texto mais detalhado sobre isso mais tarde), o filme
não busque até aliviar estas aparições do personagem aqui e acolá, assim, mesmo
após salvá-los de uma execução fria em certo momento, Gandalf e o grupo logo se descobrem com
apenas meio problema resolvido, tendo ainda um exército de orcs para enfrentar.
Mas do mesmo jeito Jackson e seus colegas roteiristas Fran Walsh, Philippa
Boyens e Guillermo del Toro nunca abdicam de serem extremamente fiéis ao texto
original.
Trazendo de volta antigos temas e criando poucos novos, Howard Shore
surge mais discreto do que na trilogia O
Senhor dos Anéis, embora seja notável sua transposição das músicas citadas
no livro para as telas e caixas de som, fazendo inclusive com que uma delas, a
cantada pelos anões invocando uma jornada iminente, se torne a música tema da
comitiva e consequentemente a do filme. E se antes o tom de uma aventura épica
era inevitável ao se ouvir o tema da sociedade do anel composto por uma
orquestra completa, ou impossível não relacionar os violinos as planícies
e cavalos no tema de Rohan, aqui é notório a realização do compositor ao compor
um tema formado por instrumentos de sopro graves e tambores que remetem
diretamente ao modo grosseiro e bruto dos anões. E mesmo que este tema
represente o ápice de seu trabalho no longa, Shore em menor escala ajuda o
miserável trabalho do montador Jabez Olssen de dar fluidez a uma narrativa
truncada e que poderia com extrema facilidade soar episódica e cansativa, uma
vez que quando se repensa o filme, todo ele parece formado de eventos isolados
com início meio e fim. E neste ponto a ideia de colocar a subtrama da ascensão
de um mau desconhecido investigado por Gandalf e Radagast (Sylvester McCoy em
uma ótima aparição) acaba dando liga não só para o filme em si como também
ajuda o espectador que desconhece os livros a "remendar" este com os
outros três filmes anteriores.
Por fim, O Hobbit - Uma Jornada Inesperada se fosse lançado há dez anos sem ter a
trilogia do Anel para lhe dar embasamento (tanto de público como de trama)
talvez não fosse o sucesso que A
Sociedade do Anel foi naquela
época. Porém, como um quarto filme a se passar na Terra Média e que traz a
proposta de ser uma espécie de prelúdio muito mais voltada ao humor e a
aventura do que a grandiosidade e ao drama, o filme é, apesar de seus pequenos
problemas (sem trocadilhos com anões ou hobbits), satisfatório e garante a um
público ainda virgem das aventuras escritas por Tolkien uma trama divertida e
carismática, ao mesmo tempo em que garante a satisfação dos leitores do
escritor com uma fiel adaptação. O que na verdade é o mínimo que se pode
oferecer quando se decide transformar um livro de trezentas páginas em três
filmes de quase três horas de duração cada.
NOTA: 9/10
Na expectativa e com ingresso comprado para domingo, quando irei ver a tão falada versão em 48 frames!
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