"Porque tu curtiu o link dele e não o
meu?" perguntou o Amigo enfurecido. Não que Fulano pudesse ouvir sua ira
e cólera, mas os emoticons mal encarados com que ele enfeitara a pergunta
sugeriam isso com mais clareza e eficiência do que a própria voz poderia fazer.
O estranho era que ele não encontrava uma resposta para a pergunta cheia de
raiva do Amigo. Nada de sensato parecia passar por sua cabeça. "E talvez não devesse" afirmou displicentemente sua
consciência, escorada na parede do fundo de sua cabeça, fumando um velho
charuto que produzia uma fumaça densa e com cheiro de mofo, "Talvez não ache uma resposta
sensata, porque não é uma pergunta sensata" disse ela sorridente, apagando o
charuto na própria mão e vindo para o meio de sua cabeça, o meio de sua atenção.
Naquele lugar escuro que era sua mente, este centro de atenção era como um spot
único de luz em um palco. E exatamente como em um filme noir, sua consciência
entrou sob ele vinda da escuridão predominante no resto do ambiente, e com
uma das mãos enfiada nos bolsos enquanto usava a outra para gesticular, ela
discursou brevemente. "Tu
curtiu o link do Ciclano, mas o link do Amigo era tão legal quanto,
certo?". Ele ficou imóvel, a pergunta piscando a sua frente ainda o
apavorava, ele não ousava clicar na caixa do chat, sabia que o Amigo saberia
que ele visualizara a conversa, então mais perguntas constrangedoras viriam e ele já estava tendo problemas o suficiente com apenas uma. Sua consciência,
impaciente, não precisava de uma resposta, pois estando dentro de sua cabeça,
ela podia sabê-las facilmente. "Então..." continuou ela.
"Talvez o Amigo, que já é seu amigo há mais tempo que o Ciclano, não
precise de uma curtida para saber que você, de fato e na vida real, curtiu o
link dele. Ao contrário do que se pode dizer do Ciclano em si, que sendo um
novo amigo, precise de algum incentivo para se aproximar de seu círculo mais
íntimo, o que pode ser feito com facilidade e eficiência através do simples e
elegante clique que se dá sobre o botão 'curtir', coisa que você, sabiamente,
fez".
"Alôôô
ta ai?" surgiu sob a pergunta maldita,
enfatizando a urgência de uma resposta. O Amigo estava impaciente, e Fulano
ainda não havia chego a nenhuma conclusão com sua consciência, que parecia
decidida a postergar a resposta o máximo possível, ou pelo menos até que se
fizesse entender. "Não
responda nada" finalizou
ela finalmente. "Como
posso não dizer nada! Ele é o Amigo! E fez uma pergunta raivosa! Tu viu o
tamanho daqueles emoticons?!" argumentou
Fulano com sua cabeça. "Se
você saísse para procurar alguém, alguém que precisasse de uma informação sua,
e o encontrasse, o que diria?" perguntou
a consciência, agora tirando de dentro de seu terno risca de giz um cantil
prateado, do qual tomou um gole, fazendo uma careta. "Pois eu diria a informação
que fui lhe dar!". "Exato!" confirmou o seu pequeno eu dentro de
sua cabeça noir. Então, logo desfez o sorriso do rosto e voltou ao tom sério
com que fizera a primeira pergunta. "E
se não a encontrasse, o que diria a ela?". Fulano parou, pensou, e
então respondeu dizendo "Nada,
se não a encontrasse nada diria! Mas o que quer dizer com isso, que devo só
ignorá-lo, fingir que nunca encontrei suas mensagens?". A consciência
parou e respirou fundo, as perguntas do garoto lhe soavam tolas e clichês, "Ele podia elaborá-las melhor,
torná-las fluídas, como se parte de um diálogo em um conto online" pensou ela enquanto ele pensava
através dela. "Pois bem,
a moral é, se nada você encontra, nada você faz com o que você não encontrou.
Assim, se sensatez é o que achou, sensatez você deve usar... Porém, este não é
o nosso caso. Uma falta de sentido e um pouco de raiva foi o que tu encontrou,
então, pela lógica, o que você tem a usar é...?" terminou a consciência com a mão
em riste, como se esperando uma resposta gloriosa.
"Mas eu curti sim Amigo" foi o que ele respondeu após correr até a
time line e curtir, de fato, o link do Amigo. Os dois se entenderam e trocaram
pelo menos três emoticons piscando, quatro sorridentes e um tristonho, mas que
não tinha nada a ver com a discussão pregressa entre ambos, e sim com a reação
a notícia de que Beltrana, uma garota que os dois achavam muito atraente, havia
quebrado a perna andando de bicicleta com os pais em alguma tradição anual de
sua família aonde todos andavam de bicicletas por algum motivo desconhecido.
Beltrana agora estudaria no primeiro andar junto com outra turma do terceiro
ano, e as ocasionais espiadas em sua calcinha, sempre exposta nas laterais de
seu quadril, entre a camiseta e a calça, não seriam mais possíveis por pelo menos
dois meses. E isto meus amigos, valia um emoticon tristonho sem a menor dúvida.
Mas com os links curtidos e apropriadamente comentados, a amizade entre Fulano
e Amigo estava garantida por pelo menos mais uma noite, e assim, o mundo
poderia descansar em paz, como muito bem representa este último gracejo que
deixo nesta história, torçamos para que nunca este símbolo de parênteses tenha
que ser virado para o outro lado... :)
por Yuri Correa
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