Com um ritmo um pouco melhor do
que o longa anterior, Alice Através do
Espelho nos leva de volta ao País das Maravilhas, um mundo que, apesar de
mágico, colorido e imaginativo, infelizmente parece ainda não refletir essas características
nas jornadas investidas pela protagonista. Embora muito menos entediada como
personagem, Alice se depara novamente com uma aventura burocrática, que carece
de criatividade no roteiro em quantidade diametralmente oposta àquela vista na
sua concepção visual. E a decepção só fica maior ainda quando o filme passa a
lidar com viagens no tempo, e desperdiça o ótimo potencial que esse tipo de
história pode gerar.
Apenas inspirado nos personagens
de Lewis Carroll (já que desta vez as semelhanças com o livro são ainda
menores, senão, nulas), o projeto logo nos reintroduz Alice (Mia Wasikowska),
que depois de alguns anos passou a levar as lições aprendidas antes como normas
de vida. Capitã do seu próprio navio, desembarca em Londres só para descobrir
que o seu antigo pretendente, que ela dispensara, agora é dono da companhia marítima
a qual se reporta, e armou uma espécie de vingança para lhe tirar a embarcação –
em uma das poucas piadas do filme que funcionam, Alice se depara com o conselho
da companhia, que se revela todo formado por homens, velhos e brancos.
Revoltada com a situação, ela acaba indo parar novamente no País das
Maravilhas, onde descobre que o Chapeleiro Maluco (Johnny Depp) está morrendo
de uma terrível depressão, pois acredita que sua família ainda está viva e perdida por aí.
Decidida a descobrir o que houve com eles, Alice rouba a Cronosfera, um objeto
mágico que controla o passado, o presente e o futuro, e que é protegido pela
personificação do Tempo (Sacha Baron Cohen).
Só pela sinopse acima já é possível
perceber que Através do Espelho tem
um arco bem mais definido do que tinha País
das Maravilhas, que se resumia apenas a eventos sucessivos colados um no
outro sem muita imaginação. Isso ajuda essa continuação a se desenvolver
melhor, porém, ainda não é o suficiente para compensar a falta de inventividade
do roteiro, que jamais cria motivos reais para que nos preocupemos com os
personagens (já que a própria heroína parece despreocupada com as consequências que seus atos podem ter na vida dos demais seres de Wonderland). Além do mais, as viagens no tempo realizadas por Alice e Tempo são
retratadas como se fossem apenas visitas em cenários diferentes – ou fases de um jogo,
não surpreendendo que aqui e ali elas até tenham “chefões de fase” -, sem criar
muita tensão sobre o que podem estar alterando, ou o quê - no futuro que
conhecemos - foram eles que causaram (já que o filme lida com a teoria de que o passado
não pode ser alterado), a não ser por uma única cena envolvendo o Tempo e a hora
do chá, que explica como encontramos certos personagens no primeiro filme.
Por outro lado, a produção segue a
linha visual de Tim Burton (diretor do primeiro longa) e cria um mundo que é visualmente deslumbrante.
Claro, caem fora a neblina e a camada de filtros dessaturados imposta pela estética
dos filmes de Burton, assim como detalhes
sombrios típicos da sua filmografia, como o rio de cabeças cortadas, sopas envolvendo
dedos e animais vivos comicamente usados como se fossem objetos inanimados.
Porém, mesmo com um pouco mais de cores, o País das Maravilhas continua tão
inventivo em seu design quanto era sob o comando do cineasta, e pontos sejam
dados ao castelo do Tempo, que visto de cima é um gigantesco relógio, ou a casa
do Chapeleiro, que tem forma de cartola. E a própria ideia de o espaço entre
os “tempos” ser um grande mar revolto acaba gerando ao menos alguns bons
momentos de ação. Ainda assim, o maior mérito do filme é realmente o personagem
de Sacha Baron Cohen (e seu ótimo timing cômico), que provavelmente veio para o
projeto a convite do novo diretor, James Bobin, com quem o ator já trabalhara
antes quando interpretava Ali G, um de seus primeiros personagens a ficar
famoso. Nas suas mãos, Tempo é um homem arrogante e pouco astuto, o que permite a ele assumir de forma plausível hora o papel de vilão e hora o de
aliado de Alice, dependendo da situação – tal qual o tempo de verdade serve a todos nós.
Já a Rainha de Copas (Helana
Bonham Carter), grande destaque do primeiro filme, e que tem grande importância
aqui, parece ser usada ao extremo, perdendo rapidamente a graça - e nem mesmo o
talento habitual de sua intérprete consegue salvar a algoz de se tornar
aborrecida. Enquanto isso, Anne Hathaway e Johnny Depp pouco tem o que fazer
com a Rainha Branca e o Chapeleiro Maluco, presos a figuras passivas na maior
parte da duração, assim como os demais amigos de Alice, como a Lebre, o Coelho,
o Gato de Cheshire (Stephen Fry) e Absolem (Alan Rickman, surgindo em seu último trabalho).
O que por outro lado coloca maior foco na protagonista, que realmente se mostra
mais ativa e viva dessa vez, graças a uma performance deveras mais carismática
e enérgica de Mia Wasikowska – o que é o mínimo que se espera de uma heroína de um filme voltado para crianças em dias de luta tão árdua pelo feminismo.
Não que isso seja suficiente para salvar o longa-metragem (infelizmente, não é), que
ainda repete à exaustão o tema musical estabelecido no primeiro, se mostrando
preguiçoso até mesmo para criar, ao menos, variações de arranjos. Uma falta de
vontade que só não é maior do que a do espectador ao final da projeção (principalmente depois de ver o título do filme surgir pela terceira vez em tela), encantado com o espetáculo de imagens, mas vazio de emoções como as diversas
criaturas digitais vistas em tela - que não fazem valer as milhares de horas em renderização que devem ter custado.
NOTA: 5/10
NOTA: 5/10
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