sexta-feira, 30 de setembro de 2016

O LAR DAS CRIANÇAS PECULIARES


É triste perceber que os méritos dos filmes de Tim Burton têm cada vez menos a ver com o fato de serem dirigidos por Tim Burton. Vindo do medíocre e completamente inexpressivo Grandes Olhos (que pelo resultado final, poderia ter sido feito por qualquer um), o distinto realizador encontra aqui outra história que discorre sobre suas temáticas favoritas, a mistura de morbidez e bom humor e o deslocamento de figuras centrais em um mundo sombrio e caricato. Porém, se por um lado Burton parece perseguir protagonistas que se encaixem nesses quesitos, por outro, é com tristeza que o vemos se tornar cada vez mais burocrático ao dirigir suas tramas.

quarta-feira, 28 de setembro de 2016

A GRAVIDADE DE LEMBRAR

Conto escrito pela minha pessoa:



Não conseguia mais dormir na sua cama. Já fazia algum tempo que uma mão pútrida batia na janela. Mosine agora se remexia no sofá da sala, sob a fina coberta que protegia sua pele do vento uivante que rebatia na soleira de entrada e passava por debaixo da porta.


Era uma mistura estranha de frio e calafrio, mas na prática o efeito era o mesmo. O relógio na parede, desses em forma de gato, em que a cauda pendula e os olhos felinos valsam de um lado pro outro, marcava 3 horas. O problema é que essa era a segunda vez que os ponteiros voltavam a esse número nesta mesma noite.

quarta-feira, 14 de setembro de 2016

BRUXA DE BLAIR


O estilo found footage (esses filmes apresentados a partir do ponto de vista de uma câmera dentro da trama) acabou se tornando refém de sua própria popularidade, com produções que entendem cada vez menos que é a naturalidade e casualidade das filmagens subjetivas que causam o terror almejado pelos roteiros – REC, Cloverfield: Monstro e os dois primeiros Atividade Paranormal são exemplares eficientes justamente por compreenderem essa dinâmica. Portanto, é sintomático que o sub-gênero tenha retornado ao projeto que o tornou famoso, A Bruxa de Blair - que também acertava ao apostar na simplicidade. Funcionando então como continuação e, ao mesmo tempo, reboot da “franquia” (o segundo e péssimo filme é sumariamente ignorado), além de uma espécie de refilmagem do original, Bruxa de Blair (2016) faz um esforço honesto para atualizar a trama, lidando com uma realidade em que câmeras estão presentes de todas as formas, o que acaba sendo também o seu maior tropeço, já que essa diversidade de pontos de vista, a estabilidade pouco natural dos quadros e planos convenientes acabam retirando a crueza que é a alma desse tipo de narrativa.

sexta-feira, 2 de setembro de 2016

AQUARIUS



Quando em certo momento de Aquarius, depois de investir em uma longa cena em torno da visita dos filhos de Clara (Sônia Braga) à casa de sua mãe (quando mantém planos fechados que nos aproximam daqueles personagens), Kleber Mendonça Filho enquadra a protagonista de longe se despedindo deles, recuando o zoom enquanto revela a pequenez da mulher em meio a um pátio vazio e estruturas desabitadas, fica claro que estamos diante de uma obra sobre perda e solidão. Não só em relação às pessoas que amamos, aos lugares e às memórias que os recheiam, mas também como indivíduos em uma existência que, pela desigualdade social, ou até pela resistência em abandonar uma estrutura que há muito não abriga mais o calor de outrora, sempre acaba encontrando um jeito de nos fazer encarar o protagonismo que temos de assumir em nossas próprias lutas.