sexta-feira, 30 de março de 2018

quinta-feira, 29 de março de 2018

CRÍTICA: JOGADOR NÚMERO 1


Tem muita gente que podia ter dirigido este filme. Há uma gama de cineastas de talento pelo mundo que construíram suas carreiras em cima da cultura pop - especialmente a das décadas de 1970 e 1980. São cabeças inteiramente capazes de compor uma obra recheada de referências com um ritmo ágil e divertido. Jogador Número 1, portanto, não é um filme autoral que somente Steven Spielberg poderia dirigir - até porque, salvo raros acertos, o realizador não dava uma dentro desde 2005, quando lançou o magistral Munique. Além disso, através de sua filmografia e influência, Spielberg contribuiu imensamente para a democratização do Cinema na grande indústria - se hoje existem inúmeras obras para serem referenciadas e uma pluralidade tão grande de cineastas excelentes, é também devido ao seu trabalho. É impossível falar sobre a história do Cinema sem passar por Spielberg.


Então, ao menos uma coisa é certa: embora qualquer um pudesse ter feito esse filme, somente Steven Spielberg tinha o DIREITO de dirigir Jogador Número 1. Baseada no livro homônimo de Ernest Cline, a trama se passa em 2045 num mundo superpopuloso entregue às grandes corporações e à miséria, onde o jovem Wade (Tye Sheridan), assim como milhões ao redor do globo, escapam da triste realidade para dentro de um ambiente virtual chamado Oasis. Criado pelo introspectivo nerd chamado Halliday (Mark Rylance), esse mundo de jogos permite que os usuários adotem avatares para travar batalhas e cumprir missões no intuito de ganhar mais moedas virtuais - e num futuro tão sombrio, não surpreende que as pessoas queiram personalizar os avatares, os objetos e cenários no Oasis com inspirações em personagens, filmes, séries, jogos e demais mídias oriundas de épocas em que a cultura pop era mais amistosa (o que dá ao filme a chance perfeita de metralhar o espectador com easter eggs de todas as origens possíveis).

segunda-feira, 26 de março de 2018

CRÍTICA: VERÓNICA


Paco Plaza dirigiu um dos melhores filmes de horror lançado dos anos 2000 pra cá, e que é também um marco no subgênero dos found footage – desses que fazem parecer que a história foi montada a partir de filmagens reais encontradas. [Rec] (2007) combinava claustrofobia e tensão com sustos armados com inteligência através do uso extremamente realista da câmera. Desde então o realizador investiu quase uma década em continuações do sucesso que, embora divertidos, jamais conseguiram alcançar a maestria do original. O que o trouxe até este Veronica, filme dono de uma narrativa mais tradicional que demonstra que o talento do cineasta não fica restrito ao estilo da sua saga de zumbis. CONTINUE LENDO AQUI>>>

quinta-feira, 22 de março de 2018

CRÍTICA: CÍRCULO DE FOGO: A REVOLTA


Aos 7, talvez 8 anos, eu adorava ir para a praça na frente de casa com os meus bonecos de R$ 1,99 e brincar que eles estavam perdidos numa floresta imensa. Quando chovia no verão, a selva virava um pântano assombrado pelo meu único dinossauro de plástico, que também interpretava o T-rex amigo do herói - provavelmente um Seiya genérico. Meu quarto já foi cenário de batalhas épicas, e o jardim um reino distante. Conto isso porque, quando Guillermo del Toro estava prestes a lançar Círculo de Fogo em 2013, me questionava como um cineasta tão talentoso em preencher de sensibilidade obras de horror de fantasia, iria encaixar delicadeza num filme sobre lutas entre monstros e robôs gigantes. O que eu falhei em perceber na época é que a delicadeza estava justamente na inocência desse conceito.



Diferente dos péssimos filmes dos Transformers, del Toro construiu Círculo de Fogo sob a perspectiva pueril de uma criança. É uma aventura fantasiosa e mirabolante, sim, mas que se leva a sério dentro de sua própria lógica - na minha imaginação, os personagens vividos pelos meus brinquedos sofriam, lutavam intensamente como se suas vidas dependessem disso (e dependiam), e por fim, se regozijavam em conquistas. Círculo de Fogo: a Revolta, continuação que já não conta mais Guillermo no comando, perdeu alguns pontos nesse aspecto. É mais cínico, seus personagens recorrentemente admitem que seus diálogos são expositivos (e são), ou mesmo que um discurso de motivação que vem em seguida, não vai ser tão épico quanto outros ouvidos no antes.

domingo, 18 de março de 2018

CRÍTICA: ANIQUILAÇÃO


Tudo o que vive, morre, e torna-se algo diferente. Em pequena escala, isso significa nascer, morrer e se decompor para fazer parte da vegetação, do alimento de outros seres vivos e das propriedades do solo. Numa visão mais abrangente, espécies surgem, evoluem e desaparecem, seja por extinção ou porque se decompõem em inúmeras outras novas formas de vida. Mesmo a geografia passa por essas mutações; através dos milênios, montanhas se levantam e são trazidas abaixo outra vez pela ação tectônica, a erosão e demais fenômenos naturais. Por um lado, é um processo triste sob a perspectiva do ser humano, pois nosso recorte é limitado a uma parcela ínfima de tempo dentro desse arco de eventos. Por outro, trata-se de um mecanismo que funciona com elegância e que obtém resultados de fascinante improbabilidade. E esse é o sentimento agridoce evocado por Aniquilação ao confrontar beleza e morte sem medo de que isso leve sua narrativa a se tornar algo diferente. CONTINUE LENDO AQUI>>>

quinta-feira, 15 de março de 2018

CRÍTICA: COM AMOR, SIMON


Com Amor, Simon não é um filme inteligente, complexo ou profundo, não tem um roteiro astuto ou uma direção sofisticada. É uma produção feita nos moldes mais batidos dos high school movies desde que eles se desdobraram das obras que John Hughes popularizou na década de 1980. Há mais de trinta anos que Curtindo a Vida Adoidado e Clube dos Cinco acumulam primos como 10 Coisas que Eu Odeio em Você, Meninas Malvadas e As Vantagens de ser Invisível. E esses são apenas alguns dos títulos que se destacaram em meio às dezenas de projetos similares lançados todos os anos, cheios de moral sobre amor, amizade e família - e o dilema de ser jovem e se descobrir mortal.


Chega a dar aquele déjà vu quando os créditos iniciais aqui já surgem embalados por uma musiquinha animada de elevador (daquelas que já enjoaram os jogadores de The Sims) enquanto o tal do Simon (Nick Robinson) vai narrando sua rotina como um adolescente no Ensino Médio. É possível prever ali, com uma hora e meia de antecedência, que o garoto vai se apaixonar, vai magoar seus amigos e depois encontrar uma maneira de conseguir seu perdão, saindo de cabeça erguida e com novas lições aprendidas.


Então por que raios precisamos de mais um filme saído dessa forminha de gelo?


Porque Com Amor, Simon é um filme sobre um adolescente gay saindo do armário, e isso faz toda a diferença.


Não estou dizendo que essa é uma temática inovadora. Pffff… nem perto disso. Indivíduos se descobrindo gays e flertando com seus primeiros desejos e atrações é provavelmente a pauta mais dissecada pelo Cinema LGBTQ - procurem por curtas sobre gays nos Youtube e nos Vimeo da vida e vão encontrar uma enxurrada de historinhas mais ou menos idênticas sobre o tema. Algumas fizeram tanto sucesso que viraram longas (caso de Hoje Eu Quero Voltar Sozinho), formato que também já discorreu fartamente sobre a tal “saída do armário”, vide o delicado brasileiro Beira-Mar, ou até mesmo o vencedor do Oscar de Melhor Filme no ano passado, Moonlight. Filmes que, aliás, são infinitamente superiores a este Com Amor, Simon, que apesar disso, encontra justamente em sua “clichêzisse” uma justificativa para existir - afinal, Clichê é apenas outro modo de descrever algo que já funcionou.


O que acontece é: ainda que se façam muitos filmes bem mais sofisticados e ambiciosos sobre o assunto, também é verdade que esses títulos normalmente se limitam ao público de festivais, à aba “filmes LGBTQ” da Netflix ou aqueles raros espectadores que preterem o novo blockbuster da Marvel para assistir um projeto independente ou uma produção local. A homossexualidade (na verdade, qualquer orientação sexual ou identidade de gênero que não a cisgênero heterossexual) dificilmente encontra espaço em mídias de grande alcance ou em obras com uma linguagem mais acessível. Aí entra Com Amor, Simon, que adota esse formato de “filme família” sobre um garoto branco de classe média e seus dramas escolares e românticos do desabrochar sexual, além dos inerentes conflitos familiares - nada que vá chocar a família tradicional brasileira se estiver passando no meio da tarde de domingo na TV aberta.


E esse é o diferencial, né? Porque além disso, Com Amor, Simon é um filme que funciona. Sim, é tudo previsível e feito dentro das regrinhas que a gente já conhece, mas é um clichê bem executado. Da fotografia lavada sem identidade à trilha meio genérica, passando ainda pelos personagens carismáticos e as piadinhas esperadas, os elementos estão todos equilibrados no ponto certo para serem digeridos pelo maior público possível. Nick Robinson é um tanto inexpressivo, mas até isso ajuda, já que Simon é um garoto por vezes introspectivo, mas isso é compensado pelos colegas de elenco, em especial Jennifer Garner e Josh Duhamel que vivem os pais do protagonista - esse último, trazendo consigo seu currículo de personagens machões, já constrói a persona de um pai meio homofóbico e que, portanto, inspira tensão pelo segredo de Simon.


Óbvio que, assim sendo, Com Amor, Simon tem falhas enormes de representatividade - é mais uma história sobre um menino caucasiano que vive confortavelmente num bairro tranquilo, onde as garotas só sabem falar sobre os meninos que as cercam etc. Mas nem é um projeto que tenta ser tão político assim, é apenas ingênuo. De fato, trata-se de um filme tão inocente e bem intencionado que, por mais que não represente grande coisa como obra, acaba agregando valor por contribuir com a naturalização de uma temática que se construiu na marginalização cultural. Sem dúvidas que perto de todo o repertório, maturidade e vanguardismo que o Cinema LGBTQ já adquiriu em todas essas décadas, Com Amor, Simon é quase como uma criança de três anos se vangloriando do seu desenho de giz de cera sob o teto da Capela Sistina de Michelangelo - mas que ainda assim é fofinha o suficiente para chamar atenção para o teor de seus rabiscos.


Nota: 7/10

segunda-feira, 12 de março de 2018

AS BANHEIRAS DE GUILLERMO DEL TORO



(clique na imagem para vê-la maior)

Não consegui averiguar a autoria da ilustração - que foi postada no Twitter pelo conta @tanglonlon. Na imagem, cenas de A Colina Escarlate, O Labirinto do Fauno e A Forma da Água.

Os títulos grifados têm crítica aqui no blog, é só clicar.

segunda-feira, 5 de março de 2018

OSCAR 90 ANOS: A CAMINHADA TRÔPEGA RUMO À DIVERSIDADE

Por Corra!, Jordan Peele se tornou o primeiro roteirista negro a receber o prêmio de Melhor Roteiro Original, categoria na qual também era inédita a vitória de um filme de horror. A Forma da Água, esse filme de fantasia que (como já foi martelado em todos os textos sobre o projeto) coloca um conjunto de minorias contra a força do homem branco e conservador, se juntou ao hall dos vencedores de Melhor Filme (sem confusões dessa vez), enquanto Guillermo del Toro marcou a quarta vez em cinco anos que um realizador mexicano vence o Oscar de Melhor Direção - e falando no país vizinho dos EUA, Viva, ao som de um sonoro "representatividade importa!" venceu como Melhor Longa de Animação e Canção Original (por uma música que fala sobre memória e sobre o resgate do que o passado tem a nos ensinar). Mas não sem alguém apontar que, para o pequeno Miguel, protagonista da produção da Pixar, era mais fácil entrar no mundo dos mortos do que nos Estados Unidos, já que lá não tinha um muro. Ainda na América Latina, o Chile bateu a Palma de Ouro de 2017 e um reincidente na categoria, saindo campeão em Melhor Filme Estrangeiro com Uma Mulher Fantástica, um filme protagonizado por um mulher transexual vivida pela atriz Daniela Vega, que subiu ao palco apresentar a canção Mystery of Love, que embala o adorável Me Chame Pelo seu Nome, cinema LGBTQ que "ousa" ser leve e romântico, sem abordar temas pesados recorrentes da temática - e que por isso, saiu erguendo a estatueta de Roteiro Adaptado.

Jimmy Kimmel, como apresentador, foi correto ao evitar as esperadas piadas com seu pseudo-rival Matt Damon (que criticou o movimento Time is Up, contra o assédio sexual), e também emplacou uma das tiradas mais certeiras ao relembrar um tempo em que filmes de super-heróis não tinham representatividade e protagonismo feminino ou negro - mais exatamente, em março do ano passado. Kimmel também se absteve bastante da apresentação em si, o que deu bastante espaço para as muitas mulheres chamadas ao palco para colocar os pontos nos i's. E nesse aspecto, Frances McDormand e toda a sua excentricidade representou o ápice da noite quando venceu em Melhor Atriz, colocando o pequeno homenzinho dourado de canto e afagando sua cabeça (num gesto simbólico poderoso), pedindo então para que todas as mulheres indicadas levantassem para receber uma salva de palmas. E não abandonou o palco antes de dizer duas palavrinhas que inquietaram a plateia e fizeram muitos espectadores correrem para o Google: "inclusion rider". A cláusula de inclusão é um recurso que artistas poderosos em Hollywood podem pedir para serem colocadas nos seus contratos, e nelas eles podem demandar que, por exemplo, pelo menos 50% da equipe de um filme seja de pessoas negras ou de mulheres.

Aliás, sem deixar de homenagear o passado nessa comemoração histórica de 90 anos, a Academia se mostrou mais interessada em olhar para o futuro, e trouxe uma montagem celebrando a nova onda diversificada de Hollywood, num vídeo protagonizado por nomes como Ava DuVernay (Selma e A 13ª Emenda), Lee Daniels (Preciosa) e a indicada a Melhor Direção Greta Gerwig (Lady Bird). E mesmo quando não teve grande representatividade, a edição desse ano reparou algumas injustiças, como, por exemplo, premiar o veterano Roger Deakins por Blade Runner 2049 em sua 14ª indicação a Melhor Fotografia - o homem é o melhor DF vivo.

Em meio a tanto "vanguardismo", a cerimônia foi interrompida inexplicavelmente por uma homenagem aos militares estadunidenses e suas "investidas pela liberdade" (palavras deles) no mundo - estariam falando do Vietnã ou do Iraque, será? Sem contar que, tudo muito bonito, mas ainda saímos sem nenhum ator negro premiado em nenhuma das quatro categorias. Além disso, Gary Oldman se tornou um vencedor controverso em meio à campanha do Me Too. Ninguém nega que trata-se de um veterano de talento único e com uma carreira invejável, mas que tem no passado acusações de violência doméstica. Ok. Sejamos justos, ele foi absolvido delas e muitos testemunharam a seu favor - mas isso significa que Oldman realmente é inocente ou apenas que é mais um exemplo de como a palavra dos homens se sobressai a das mulheres em Hollywood? Na dúvida, era melhor ter premiado o jovem Timothée Chalamet, segundo favorito que, caso vencesse, seria o mais jovem campeão da categoria - e Guillermo del Toro dedicou sua vitória a nova geração de artistas ein. E se não fosse pra ele, o ótimo Daniel Kaluuya estava logo ali do lado, e esses dois se beneficiariam bem mais do reconhecimento do que o já gabaritado Gary Oldman.

Entre esses altos e baixos, foi uma cerimônia mais contida, ciente do luto (substantivo e verbo) instaurado naquele ambiente - todas as canções falavam de alguma forma sobre racismo, imigração, memória, amor e sobre abraçar o diferente, e todas foram aplaudidas de acordo. Mesmo as piadinhas que intercalaram a cerimônia (vide a boa ideia do Jet Ski), não dispersaram a atenção - e como seria possível? Armie Hammer distribuindo lanches com um canhão de cachorros-quentes não é uma imagem que se vê todos os dias.