É bom eu deixar claro que mesmo Speed Racer é uma obra fantástica e incompreendida,
e A Viagem, um drama sensível e
orquestrado com maestria. Seria muito fácil atacar o novo filme dos irmãos
Wachowski, tem sido assim com a sua filmografia e isso desde Matrix. Aqui em O Destino de Júpiter, a ausência de uma ameaça que paire sobre os
protagonistas, em parte por causa de um vilão ausente, a estrutura convencional
e o reaproveitamento pobre de ideias já exploradas antes por Andy e Lana em
seus filmes anteriores, poderiam ser fermentadas a ponto de fazer um péssimo
retrato do longa-metragem. Que, apesar disso, é carismático, empolgante e
visualmente fantástico o suficiente para suprimir esses óbvios problemas.
A trama conta com a história já
conhecida do indivíduo destinado a grandes feitos que não sabia fazer parte de
um mundo mágico a parte. Assim, quando o mercenário interplanetário Caine Wise
(Channing Tatum) chega para salvar Júpiter (Mila Kunis) de assassinos de
aluguel – também interplanetários – já é fácil prever o que vem em seguida: a
moça não chega a ser uma “escolhida”, mas é a recorrência (outro nome dado para
reencarnação, sobre o que os Wachowski já haviam falado bastante em A Viagem) da poderosa e nobre
matriarca da família Abrasax, dona de diversos planetas em que se cultivam
seres-humanos, de onde tiram a essência de sua principal mercadoria, um produto que os rejuvenesce e mantêm vivos por milênios – algo que os irmãos
também já haviam abordado em Matrix,
e aqui, qualquer semelhança com Duna
é mera coincidência, cof cof.
De fato, O Destino de Júpiter lembra bastante aquele longa de David Lynch, principalmente
pela estranheza causada pelo novo mundo que apresenta, com suas concepções
visuais e características próprias. Mas ao contrário de Duna, aqui há um roteiro coerente – sim, batido, mas coerente –
personagens carismáticos por quem torcer, e a trama tem um ritmo que empolga e
deslumbra (palmas para a montagem aliada à trilha de Michael Giacchino que
criam essa fluidez), não um que te faz preferir chutar a cômoda com o mindinho
repetidamente. Mila Kunis e Channing Tatum tem empatia fácil e dividem uma
química divertida que até perdoa a rapidez com que a garota se apaixona por
ele.
Ainda no elenco está Sean Bean,
que por si só é um spoiler ambulante, que afinal acaba surpreendendo e até
fazendo rir com sua modesta participação. Que ainda assim deve ser maior e mais
presente que a de Eddie Redmayne, o grande vilão que tem todas as suas cenas
expostas no trailer. Ainda bem, os obstáculos colocados no caminho de Júpiter e
Caine não são sempre obras desse Balem, o mais velho dos irmãos Abrasax, que
querem tomar a Terra, já que a protagonista a herdou ao se descobrir como realeza
interplanetária. De qualquer forma, o roteiro, também escrito por Andy e Lana,
subestima o potencial do interessantíssimo personagem concebido por Redmayne,
que, ao contrário do que muitos poderiam dizer, não está de maneira alguma em
modo over, e dentro do contexto do longa-metragem está na verdade é muito
apropriado e elogiável, com o contraste de seus modos elegantes e voz suave,
com as suas súbitas explosões de raiva – haja bom senso minha gente, estamos
falando do cara que tem milênios de idade e que anda com lagartos alados
gigantes como seguranças a sua volta... Não exijam do pobre menino uma
performance realista e dramática em um filme que em momento algum pretende ser
essas coisas...
Uma pena é que o desfecho do
personagem, e do clímax em si, seja um tanto quanto decepcionante, e é a
jornada até ele que acaba divertindo realmente, com suas inserções de humor
aqui e ali – particularmente a piada da burocracia que envolve a retirada de um
documento de realeza de Júpiter dura o tempo necessário em tela para fazer rir
antes de perder a graça – e cenas de ação
visualmente impressionantes, o que é sempre o mínimo que se espera dos irmãos, além de personagens que não se perdem em meio ao apelo estético. Aliás, o design de
produção do longa-metragem é belíssimo e, sim, um completo exagero, e aposto
que um livro de artes conceituais do projeto renderia um volume bem abastecido.
Eu não estou louco para rever O Destino
de Júpiter, é verdade. Não como eu fiquei depois de cada filme da trilogia Matrix, de Speed Racer e de A Viagem.
De fato, é o projeto mais irregular dos Wachowski, mas não por isso, um que
seja, de jeito algum, ruim em sua totalidade.
NOTA: 7/10
No geral, um bom texto, colega.
ResponderExcluir