quarta-feira, 4 de junho de 2014

A CULPA É DAS ESTRELAS



Primeiramente, eu não li o livro do John Green, e já cansei de falar aqui que filme é filme e obra que o originou é, enfim, obra que o originou. São coisas distintas e DEVEM a princípio – vá saber, a proposta pode mudar eventualmente – serem independentes. Resumindo: não ter lido um livro não faz de ninguém menos apto a avaliar um longa-metragem adaptado do mesmo. Então deixem o “mimimi” aqui neste parágrafo se querem saber a opinião oficial do Classe de Cinema sobre A Culpa das Estrelas. Livres do “mimimi”? Beleza! É bobinho? É. É Meloso às vezes? É. Isso quer dizer que o filme é ruim? Não. Graças a um punhado de intérpretes carismáticos é possível se envolver e se importar com o arco bonitinho e – surpresa! – sóbrio de Hazel e Gus.



É bem verdade que o roteiro de Scott Neustadter e Michael H. Weber não nega suas origens literárias, e é possível notar certo inchaço na duração causados por diversos, pequenos e óbvios fan services. Que não necessariamente servem à trama, mas como tampouco a atrapalham, meu único problema com o texto acaba sendo sua natureza um tanto episódica. Porém, esse trata-se de um mal comum em adaptações em geral, e é até louvável que o ritmo possua alguma fluidez; conta-se então a história de Hazel Grace (Shailene Woodley, aqui bem melhor do que no insosso Divergente), uma adolescente diagnosticada com câncer que, em um grupo de auto ajuda, conhece Gus, um garoto cuja condição igualmente enferma outrora lhe custara uma das pernas. Com o tempo, o menino interessa-se romanticamente por ela – dãã – que por sua vez se mostra resistente por temer a perda eminente que um do dois sofrerá caso se relacionem. O que, claro, não vai impedi-los de viver uma historinha de amor cheia de lições de vida batidas.


Ainda que, atores como Laura Dern e Willem Dafoe tragam certo peso para a narrativa ao investirem em personagens que fogem elegantemente dos clichês do gênero. Sim, a mãe interpretada por Dern é sofrida e melancólica, como qualquer pessoa em sã consciência colocada em sua situação deveria ser, mas ao mesmo tempo já apresenta os indícios de uma convivência diária com a eminência da morte da filha, e em um momento tocante revela que já tem planos para o pós-óbito de Hazel que não são apenas lamentar a sua partida. Já Dafoe, ao invés de representar a salvação e última vontade realizada dos protagonistas, mostra-se um canalha detestável e amargurado que reflete o espírito cínico com que A Culpa é das Estrelas parece abordar a relação do casal central.


Hazel e Gus poderiam facilmente tornar-se uma Bella e um Edward em um conflito que se estenderia – literalmente no caso dos segundos – ad infinitum sobre se deveriam ou não ficarem juntos. Diferentemente, o filme prefere trazê-los de forma mais lúcida, encarando com uma maturidade insuspeita sua própria situação. Ok, essa maturidade é expressa em exposições adocicadas e levianas que tentam sabotar o seu próprio teor, mas ainda assim, expressas de qualquer modo. Gus admite que se magoará muito com a perda de Hazel, mas tampouco deixa de reconhecer que ele mesmo tem pouco tempo de vida, cedendo ao seu lado mais emocional ao invés do racional, o que ajuda a elevar essas figuras de meros ícones adolescentes para seres humanos críveis. O garoto, por exemplo, fixa seu olhar na menina displicentemente na primeira vez que a vê, não negando mais tarde que o faz porque deseja usufruir de cada impulso que lhe vem. Essa espontaneidade com que Ansel Elgort (repito o comentário sobre Divergente) é benéfica ao projeto não só por tornar Gus divertido e carismático, fugindo também aos lugares comuns do romântico incurável, como igualmente serve de base de contraste para sua depressão mais tarde, quando o avanço da doença faz com que se torne mais dependente de outras pessoas. Já Woodley é eficaz ao fazer menos chata uma protagonista que além de lidar com limitações físicas, também se mostra cética sobre quase tudo. Sua Hazel Grace é adorável o suficiente para justificar o entrosamento com o público, afinal, mesmo condenada por sua saúde, a garota surpreende ao se mostrar positiva quanto a sua situação. “Você não estragou a nossa viagem” contradiz ela o personagem de Dafoe em certo momento.


Inseridos em situações que, dentro das suas próprias proporções, são bem inventivas, os nossos “heróis” também merecem palmas por não estarem perdidos em um filme completamente sem conflito, como, por exemplo, cof cof, Crepúsculo. De sua obsessão por descobrir o final de um livro – que reflete o seu desejo de que seus entes queridos tenham eles mesmos um final feliz apesar do trauma de perdê-los – passando por uma vingança que envolve ovos e um carro, até um discurso fúnebre feito ainda em vida para os futuros falecidos, A Culpa é das Estrelas entende corretamente que não só de “eu te amo’s” é feito um romance, não esquecendo de rechear a vida daqueles dois com momentos memoráveis que façam valer a pena para o público torcer e lamentar com eles. E por entender isso e priorizar esta abordagem é que o diretor Josh Boone merece alguma lembrança aqui; por isso e pelo sutil momento relâmpago – do tipo piscou, perdeu – em que ao fundo do quadro mostra Gus invertendo o cigarro na boca do amigo cego, num simples, corriqueiro e simpático ato de amizade genuína. O cineasta também tenta ao máximo evitar o tom melodramático, ainda que conforme avance a duração do longa, esta se torne quase inevitável. Mas nada que incomode. Muito. Boone também coloca aqui e ali algumas referências da cultura pop em pôsteres, cenas de filmes, citações, etc, o que embasa eficientemente a vida pregressa daqueles jovens.


Os mais sensíveis irão às lagrimas sem dúvidas, eu mesmo tive um nozinho na garganta em certo momento, mas não é nenhum dramalhão ou mesmo um filme muito complexo. Cumpre um pouco mais do que promete, o que já satisfaz. Não incomoda com suas eventuais pieguices e diverte enquanto dura. A história do casal de pacientes terminais ficará na memória? Não. Hazel e Gus vão? Provavelmente.



NOTA: 8/10




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