segunda-feira, 30 de julho de 2018

CRÍTICA: MISSÃO: IMPOSSÍVEL - EFEITO FALLOUT


Missão: Impossível virou o tipo de filme em que é normal um diálogo decisivo entre o herói e o vilão acontecer com um deles dentro de um elevador, enquanto o outro vai pendurado pelas pontas dos dedos na parte de baixo do mesmo. Entretanto, se 007 deixou pra lá os vilões caricatos e se entregou a um tom mais “realista” e brutal nos últimos capítulos, enquanto Velozes e Furiosos saiu de uma disputa de gangues para virar a galhofa divertidíssima envolvendo submarinos nucleares que é hoje, a franquia M:I chega ao seu sexto (e melhor) filme se equilibrando perfeitamente entre uma narrativa que consegue se levar a sério, sem com isso abandonar a ação inusitada típica das aventuras de Ethan Hunt (Tom Cruise).


E isso porque Efeito Fallout se beneficia de duas ferramentas essenciais do gênero de Ação: a primeira é a materialidade, aquilo que o espectador olha e sabe que é real, ou que o convence que é - e por mais avançada que possa estar a computação gráfica, aquilo que é “feito à mão” ainda tem uma vantagem sobre o CGI; a segunda ferramenta é a compreensão, pois torna-se mais divertido para a audiência quando pode entender o que está acontecendo. E não só a mise-en-scène (quem está onde em relação a quê), mas também as motivações e objetivos dos personagens - o domínio desses elementos, por exemplo, cimentou o sucesso de Mad Max: Estrada da Fúria.

Mas ao contrário do veterano George Miller, que preferia investir em cortes sucessivos e construir as lutas e perseguições na sala de montagem, aqui em Efeito Fallout, o diretor Christopher McQuarrie prefere algo mais clássico. Seus planos são mais abertos e mais longos, deixando que as elaboradas coreografias dos embates corpo a corpo sejam vistas e compreendidas pelo espectador - e parte da diversão está em ver os atores desferindo golpes e usando o cenário e os objetos ao redor de forma criativa (em certo instante, até mesmo o formato de um pedaço de cano utilizado como arma, faz diferença no resultado da uma briga). Aliás, o cineasta traz uma abordagem bastante Hitchcockiana para introduzir novos cenários e personagens, apresentando a geografia dos espaços com clareza e com uma cadência que fazem jus ao mestre do suspense. A briga no banheiro, por exemplo, é precedida por uma cuidadosa sequência que acompanha o reconhecimento do local por dois agentes - e estratégias como essa se repetem ao longo da narrativa. Assim, quando tem início uma cena de ação, o cenário que a abriga normalmente já se tornou familiar para quem assiste. De forma parecida, o momento que traz a agente Isla Faust (Rebecca Ferguson) seguindo de perto outra pessoa pelas ruas de Paris, é conduzido pelo diretor de maneira elegante e paciente, sempre posicionando “presa” e “caçador” de modo a saber onde está um e para onde vai o outro, o que remete à icônica sequência em São Francisco de Um Corpo que Cai.

Não por acaso, Christopher McQuarrie é o primeiro cineasta que retornou para dirigir mais de um dos Missão: Impossível, depois de ter alcançado méritos muito similares no excelente Nação Secreta, que antes já parecia ter sido o ápice das maluquices de Ethan Hunt. Aliás, provavelmente também por isso, é a primeira vez em que um dos filmes da série surge como uma sequência direta do anterior. Embora lute para manter a mesma independência que os demais capítulos possuem um dos outros, Efeito Fallout ainda está essencialmente ligado à trama do vilão Solomon Lane (Sean Harris), que depois de ser capturado por Hunt, deixou para trás um grupo de seguidores fanáticos que querem agora construir bombas nucleares para dar continuidade ao seu trabalho. No encalço do plutônio que eles vão usar para isso, estão Hunt e o agente da CIA August Walker (Henry Cavill), este último enviado para impedir que Ethan priorize a vida de seus amigos Benji (Simon Pegg) e Luther (Ving Rhames) em prol dos objetivos da missão - que acaba se complicando quando Isla Faust volta à cena.

Novamente assinando o roteiro, McQuarrie também imprime um tom de conclusão inédito na franquia até agora. Não só a trama retoma e amarra diversas pontas soltas deixadas pelo filme anterior, como também ao longo de todos os outros quatro longas. Além disso, através de algumas referências, o cineasta faz pelo menos um aceno cordial a cada uma das produções: o cenário falso (M:I 1), Ethan se passando por um negociante de armas (M:I 4), a perseguição de motos (M:I 2), a própria presença de Michelle Monaghan (M:I 3) e mesmo a citação à Max (a fantástica personagem de Vanessa Redgrave em M:I 1). Desta maneira, Efeito Fallout constrói o sentimento de que cada uma das aventuras do agente Hunt contribuíram para que ele conseguisse superar o desafio proposto dessa vez - o que torna de certa forma sensível quando, em um último recurso desesperado, Ethan é obrigado a escalar um penhasco rochoso para completar a missão, remetendo à abertura de M:I 2.

E o filme faz isso sem jamais perder uma identidade própria. Aliás, visualmente, esse M:I 6 é também o mais impressionante de todos os capítulos. Não só pela escolha de McQuarrie em filmar cenas em locação com helicópteros e demais veículos de verdade, conferindo ao projeto a tal da materialidade que apontei ali em cima, como ele e o diretor de fotografia Rob Hardy trabalham juntos oscilando entre dois extremos: por vezes abusam das lentes tele para criar planos que chapam o fundo com os objetos em primeiro plano, criando uma escala megalomaníaca como a daquele quadro do avião contra a lua logo no início, ou outro que traz um homem sobre um obelisco no meio de Londres, e ainda mais um que acompanha a indispensável e famosa corridinha de Tom Cruise, centralizado sobre um longo telhado; e noutras, preferem utilizar o escopo das câmeras IMAX para conceber imagens vertiginosas, como a de dois helicópteros sobre um lago nas montanhas, ou aquele que traz Hunt observando uma tempestade através da comporta aberta de um avião - e que culmina num plano sem cortes aparentes cheio de energia que salienta a tensão do salto dele e de Walker sobre Paris.

Além disso, Hardy também faz escolhas mais sutis, como o uso de uma película menos sensível que deixa as cenas mais escuras bastante granuladas, ressaltando o peso da atmosfera nesses momentos - funcionando especialmente na dramaticidade de uma uma visualização que Ethan faz do plano de assalto elaborado por alguns bandidos. Aliado a esse tom entra a trilha de Lorne Balfe, habitual colaborador dos trabalhos de Hans Zimmer e que carrega de maneira óbvia essa influência nas suas composições, lembrando bastante os acordes melancólicos que Zimmer compôs para O Homem de Aço (que trazia o próprio Cavill à frente do elenco) e também aqueles mais urgentes que acompanharam Batman: O Cavaleiro das Trevas Ressurge - e não deixa de ser curioso que este último e M:I 6 tenham ambos os clímax pontuados por imagens similares de aeronaves carregando objetos através de cabos sob elas.

E ainda no departamento de som, eu ficaria surpreso se Efeito Fallout não surgisse como um dos favoritos aos principais troféus da categoria na próxima temporada de prêmios pelo modo como consegue utilizar diversos recursos sonoros, sabendo dosá-los para extrair o máximo de seu impacto. Ao invés de dar carta branca à trilha pesada de Balfe, por exemplo, McQuarrie sabe quando é melhor deixá-la dominar completamente a sonoridade da narrativa (a exemplo de toda a sequência que reintroduz Solomon Lane), e quando silenciar o compositor e deixar apenas que o desenho de som assuma o protagonismo - e nesse quesito, a já citada briga no banheiro (que além de tudo, também atesta as ótimas concepções do design de produção) e parte da perseguição por Paris ganham tons mais brutais (e urgentes) graças à construção feita pelos efeitos sonoros. E repare no instante de puro brilhantismo quando uma moto acelerando ao lado de inúmeras colunas num corredor passa a produzir um som cada vez mais alto e intenso conforme anda mais rápido, representando a ferocidade da assassina que pilota o veículo.

Porém, outra boa parte dos méritos de M:I 6 é que seu elenco se compromete com a ideia de vender esses personagens impossíveis (hum?), não importa o quão absurda fique a situação - vide o já citado diálogo entre herói e vilão num elevador. E se Angela Bassett parece um pouco deslocada com seus trejeitos e entonação caricatas, Tom Cruise volta a demonstrar uma disposição contagiante (ainda mais tendo em vista seus 56 anos); Henry Cavill, que já sabia se colocar de forma imponente em cena, ganha também a oportunidade de demonstrar uma dubiedade inquietante sobre seu August Walker, enquanto Rebecca Ferguson, com menos tempo de tela do que em Nação Secreta, continua a sugerir tanto amabilidade quanto uma ameaça iminente em Ilsa, deixando que Simon Pegg e Ving Rhames sirvam de coração em meio a tanta violência e traições - e esse último surpreende por conseguir trazer comoção a um delicado diálogo.

Contando também com não apenas um, mas dois dos melhores vilões de toda a franquia, Efeito Fallout costura uma variedade bem-vinda de sequências de ação - que embora constantes, sempre são criativas e jamais soam como repetições. E apesar de uma nova continuação ser bastante possível e até desejada (pessoalmente, eu queria ver Ethan Hunt outra vez), a série estaria bem servida se contasse com esse como seu último capítulo. É um desfecho elegante, sem pontas-soltas e, acima de tudo, é um filme excepcional.

Nota: 10/10



Um comentário:

  1. Cada personagem tem seu devido tempo em tela, e a trama consegue trazer elementos dos filmes anteriores e criar um desfecho para todas as pontas soltas na franquia. Amo os filmes de ação, também recomendo um dos melhores filmes de Gerard Butler Tempestade: Planeta em Fúria, me manteve tensa todo o momento, se ainda não a viram eu recomendo muito! No elenco vemos a Gerard Butler e Andy García, dois dos atores mais reconhecidos de Hollywood que fazem uma grande atuação neste filme. Realmente a recomendo.

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