sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

O HOBBIT: A DESOLAÇÃO DE SMAUG



     De certa forma, esta segunda parte de O Hobbit sofre e se beneficia, ao mesmo tempo, de se tratar de uma parte do meio de uma trilogia: aproveita, sim, não ter de apresentar seus personagens, coisa já muito bem feita no longa anterior, partindo desde o início para a ação, que permeia quase todo o desenrolar de sua trama. O que não parece ser o suficiente para salvar o ritmo truncado e às vezes até anticlimático que se apega ao longa, principalmente em sua primeira metade.


     Vale lembrar que na versão para o cinema de As Duas Torres (também o capítulo do meio da outra trilogia) acontecia o mesmo, porém lá, Jackson de fato havia como justificar as mais de três horas de duração de seu longa - e as quase quatro (!) da versão estendida, esta sim com um ritmo admirável. Já aqui, o cineasta repete a linha adotada em Uma Jornada Inesperada e entrega um filme mais do que fiel à sua obra original e que justamente por isso, nem sempre possuí o melhor dos andamentos. É claro que cada longa-metragem possuí uma proposta e não estou dizendo que é errado que este se proponha a ser basicamente fiel a seu material de origem, e enquanto leitor da obra de Tolkien, me maravilhei ao ver transportados para as telas todos os personagens e momentos do livro, porém, não posso jamais esquecer-me de meus princípios como admirador e estudioso do cinema, afinal um filme tem que se sustentar como filme, e não como uma obra dependente de outra mídia para se fazer entender. E deste ponto de vista, A Desolação de Smaug é primariamente um filme feito de fãs para fãs, e consequentemente, uma obra por natureza, excludente. Assim, como apreciador do escritor e das adaptações de Jackson, me senti satisfeito e contente, mas não posso ignorar que como cinéfilo, vejo alguns problemas neste segundo filme. Vejamos:


     Investindo em uma palheta mais dessaturada que a do filme anterior, tanto que já se fazem notar as cores mais pálidas desde as logos iniciais, Jackson e seu montador, Jabez Olssen (também responsável pelo arrítmico Um Olhar do Paraíso), decidem usar um recurso que surgira de forma muito mais orgânica no início de As Duas Torres, um flashback. Se lá no longa de 2002 acompanhávamos o destino de Gandalf (Ian McKellen) após cair no precipício, aqui temos oura vez o mago, agora em seu primeiro encontro com Thorin (Richard Armitage), o líder da comitiva dos anões. Passado esta breve introdução que tem como clara função rever e esclarecer alguns fatos da trama para o público médio, continuamos a acompanhar Bilbo (Martin Freeman) como o ladrão contratado pelos anões de Erebor, estes em busca de seu lar e tesouro, ambos sob a custódia do maléfico dragão Smaug (voz de Benedict Cumberbatch). Enquanto isso, Gandalf parte em sua própria jornada para descobrir que tipo de mal vem crescendo secretamente na Terra Média, indo de encontro a uma fortaleza que dizem habitada por um Necromante (voz de Cumberbatch também).


     É quase dispensável que se dedique muitas frases para elogiar a direção de arte, os efeitos visuais, figurinos e maquiagens, que voltam a se mostrar excelentes - há aqui e ali um take onde a computação digital fica muito óbvia, mas são raríssimas exceções. Mas do mesmo modo seria um crime não falar como estes recursos servem à narrativa eficientemente, e uma cena onde elfos, anões e orcs se enfrentam numa corredeira é especialmente divertida graças ao bom uso destes elementos digitais. Sem contar que quando finalmente surge em tela, Smaug se revela uma criação belíssima, crível e por si só cativante, como se não bastasse a locução teatral de Cumberbatch.


     Embora sendo o vilão principal da história, Smaug possuía uma participação menor no livro de Tolkien, aqui, esta é bem mais inflada para acomodar um clímax satisfatório (do ponto de vista Peter Jacksoniano, claro), some isso ao fato de que o diretor ainda incluí subtramas inexistentes na obra original (a Tauriel de Evangeline Lilly é uma criação interessante, aliás), e temos todo um terceiro ato que jamais consegue estabelecer um ritmo entre suas unidades, ainda que isoladamente, cada uma delas funcione bem, sendo na transição de uma para outra o problema: quando começamos a nos empolgar com o embate entre os anões e Smaug, somos cortados para a Cidade do Lago (note-se, concebida visualmente por Guillermo del Toro) para acompanhar Tauriel, Bard (Luke Evans) e o adoecido Kili (Aidan Turner), e novamente quando começamos a nos envolver mais com aquela trama, somos jogados para Gandalf em sua busca pelo Necromante, para que tudo se repita de novo periodicamente. Uma condução truncada que parece até mesmo desculpável quando se pensa no começo do longa, este sim, levado aos tropicões. E por mais que seja bacana ver em tela o troca-peles Beorn (Mikael Persbrandt), é fácil perceber que sua participação na trama poderia ter sido burlada sem problemas, ao invés disso, o personagem está lá, e sua aparição é uma âncora que impede o longa de começar com a empolgação necessária.


     Pois sim, A Desolação de Smaug possuí consideráveis minutos a mais, e é triste que eu tenha de observar isso após quatro filmes onde a longa duração jamais foi um quesito a ser questionado. E não digo que não há diversão aqui, de jeito nenhum, ela existe, mas vem em pequenas porções de cada vez, parecendo não haver entre elas muito mais do que a vontade de seu diretor de ser fiel a um livro. Claro que é um fato notável Jackson continuar a demonstrar uma paixão incontestável para com as histórias de J.R.R. Tolkien, mas talvez seja amor demais. Ao menos, soube terminar o filme no momento certo, e o eficiente cliffhanger ao final deve segurar o público médio até a terceira parte no ano que vem.


PS- Reparem no próprio Peter Jackson repetindo sua ponta em A Sociedade do Anel durante o flashback que dá início ao longa. É a primeira figura em tela. 

PPS- Martin Freeman continua a demonstrar uma veia cômica admirável, não poderiam ter escolhido um melhor Bilbo.


NOTA: 8/10      





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